Sentença reconhece hipossuficiência do dono da Havan, aplica CDC e determina exclusão de perfis falsos do TikTok
17 de novembro de 2023
“A empresa de tecnologia, ao não oferecer um canal de solução dos problemas criados em seu próprio meio, simplesmente descarrega toda a sua responsabilidade à vítima (que precisa ajuizar uma ação judicial junto ao maior Poder Judiciário do mundo, em número de processos) e, por consequência, canaliza ao Poder Judiciário uma obrigação que seria sua, ao não permitir que qualquer pessoa possa fazer a reclamação administrativa, sem ser cliente da plataforma.”
O entendimento é da juíza Joana Ribeiro, da Segunda Vara Cível da Comarca de Brusque, e consta de sentença que determina à empresa ByteDance Brasil Tecnologia Ltda., proprietária da rede social TikTok, a exclusão de seis perfis falsos do empresário Luciano Hang, proprietário da rede de varejo Havan, sob pena de multa diária de R$10 mil reais, limitada ao patamar de R$ 500 mil reais.
Na ação de obrigação de fazer, o empresário buscava a confirmação de tutela antecipada para exclusão definitiva dos perfis falsos, alegando que suas contas nas redes sociais estão inativas por força de decisão judicial e que pessoas desconhecidas “vêm fazendo uso indevido de sua imagem e de seu nome a fim de propagar conteúdo duvidoso, induzindo outros usuários da plataforma a acreditarem se tratar da sua pessoa e de ser o autor de tais manifestações. Não bastasse isso, argumenta a gravidade da situação, pelo fato de utilizarem seu nome e sua imagem sem autorização, aprofundando a confusão”.
Na ação, a empresa responsável pela popular rede social de vídeos curtos argumentou, entre outros pontos, que “as URL são facilmente identificáveis e que só pode ser compelida à remoção de contas/conteúdos após a ordem judicial específica para remoção, que deverá ser precedida da indicação da URL específica a ser delimitada pela parte autora”.
Ao acolher os argumentos da defesa do empresário, a juíza registra que, de fato, “o Marco Civil da internet só responsabiliza o provedor quando há descumprimento de ordem judicial”. No entanto, frisa que “a questão não é esta, mas sim, a situação de que a ré mantém uma rede social – que lhe propicia lucros – sem garantir que uma pessoa vítima do seu meio consiga administrativamente obter a exclusão de um perfil falso, por não ser usuário da rede”.
Hipossuficiência
Nesse sentido, pontua a magistrada sentenciante:
E daí que aflora efetivamente a hipossuficiência do autor, pois diante de um ambiente digital o qual não tem acesso, por não ter conta, por não poder tê-la ou por não querer tê-la, não tem outra opção para solucionar a falsidade, senão por meio de uma ação judicial.
Ou seja, a empresa de tecnologia, ao não oferecer um canal de solução dos problemas criados em seu próprio meio, simplesmente descarrega toda a sua responsabilidade à vítima (que precisa ajuizar uma ação judicial junto ao maior Poder Judiciário do mundo, em número de processos) e, por consequência, canaliza ao Poder Judiciário uma obrigação que seria sua, ao não permitir que qualquer pessoa possa fazer a reclamação administrativa, sem ser cliente da plataforma.
Daí que a obrigação de fazer alguém ser consumidor de uma plataforma, para conseguir sair dela, é o completo abuso do consumidor.
Código de Defesa do Consumidor
Sobre a aplicação do CDC ao caso concreto, estabelece a sentença:
Quanto à URL, cabe à ré, por seus meios tecnológicos, identificar, pois a legislação exige apenas que a identificação seja clara e específica e cabe ao provedor a expertise para descobrir a URL e não à parte que não tem acesso à rede, tampouco cabe ao judiciário, pois: ‘§ 1º A ordem judicial de que trata o caput deverá conter, sob pena de nulidade, identificação clara e específica do conteúdo apontado como infringente, que permita a localização inequívoca do material’.
Nesse sentido, as regras especiais insculpidas no Código de Defesa do Consumidor são aplicáveis sim e inclusive a inversão do ônus da prova, consoante previsão do art. 6º, inciso VIII, é suficiente para comprovar que foi a ré quem deu causa à ação.
Procedimento comum cível número 5005069-46.2023.8.24.0011