A juíza Cleni Serly Rauen Vieira, da 3ª Vara Cível da Comarca de Florianópolis, acolheu pedidos de tutela provisória de urgência antecipada formulados pelo juiz Rudson Marcos e pelo promotor de Justiça Thiago Carriço de Oliveira, que atuaram no processo envolvendo o suposto estupro da influenciadora digital Mariana Ferrer em um beach club de Jurerê Internacional, e determinou ao site The Intercept Brasil que promova, no prazo de 48 horas a partir da intimação, a retificação das matérias que mencionam “estupro culposo” como fundamento da absolvição do réu, o empresário André de Camargo Aranha.

Na decisão, a magistrada ressalta que “da análise sumária e objetiva das provas que até aqui se apresentam, concluo que as matérias, em maior parte, informaram os fatos de forma distorcida, inverídica, parcial e sem precisa e prévia apuração dos acontecimentos para sua correta divulgação”.

A juíza destaca que “no livre exercício dos direitos à informação e expressão admite-se a opinião crítica, o que não se tolera, entretanto, é aquela que extrapola o direito de informar, causando lesão a direitos individuais de terceiros, tampouco a notícia falsa ou veiculada de forma temerária e antiética”.

Para a magistrada, diversamente do divulgado, não se falou em “estupro culposo”, mas, sim, que não era possível o acusado ser condenado, porque não ficaram comprovados o dolo, a impossibilidade de resistência da vítima devido à embriaguez e a consciência pelo acusado dessa vulnerabilidade.

Diz a decisão:

[…]
Evidente que não se pode exigir conhecimento jurídico teórico e aprofundado do leigo, representado, especialmente no presente caso, pelo público receptor da informação. Justo por isso, ao divulgar ao público qualquer informação técnica de área que extrapole àquela da expertise do subscritor da informação, especialmente diante da complexidade fática e jurídica do caso e da cautela que se exige do operador do direito na aplicação da lei penal, é que se espera do jornalista prudência na divulgação da informação, compromisso com a verdade e ética profissional, máxime em se tratando de uma decisão final de um processo judicial.
É dizer, o jornalista é responsável pela informação que divulga.

Prossegue a magistrada:

Ainda, a incoerência e contradição das informações divulgadas também transparece do fato de que, ao mesmo tempo em que as matérias descrevem que no ato da sentença se fala em modalidade culposa, citam os próprios fundamentos da sentença que mencionam a inexistência de crime. Ocorre que, na prática, a consequência jurídica para o crime culposo é a condenação, com pena reduzida em relação ao crime doloso, e não a absolvição, como de fato ocorreu no caso. E se esse proceder é um “artifício usual ao jornalismo” – palavras extraídas da matéria da ré The Intercept -, tal recurso, em minha singela opinião, deve ser revisto, sob pena de que a utilização de palavras descontextualizadas e que não definem corretamente determinada situação, causarem graves prejuízos a quem, para quem e de quem se informa. Logo, observa-se a prática de jornalismo sensacionalista, desprovido de seriedade e respeito às instituições e sem compromisso com a correta divulgação dos fatos e com a imparcialidade.

Ambos os despachos ordenam:

Ante o exposto, com fundamento no art. 300 do CPC, DEFIRO a tutela de urgência antecipada para DETERMINAR que as rés, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas da intimação da presente decisão, promovam a RETIFICAÇÃO das notícias veiculadas nos seus canais de comunicação – links item 6, “a”, “(i)”, da inicial, bem como em suas redes sociais no Twitter, Instagram, Facebook e Youtube, com referência de que o fazem por força da presente decisão, mediante os esclarecimentos de que a) a expressão “estupro culposo” não foi citada, tampouco foi fundamento da sentença criminal proferida pelo requerente na ação penal n. XXXXXXX-XXXXXXXXX; b) o requerente, na qualidade de juiz da causa e presidente do ato da audiência de instrução e julgamento em que ocorreu a oitiva da vítima, realizou várias intervenções para manutenção da ordem, esclarecimentos à vítima e advertências ao advogado de defesa, fatos esses que omitidos no vídeo com duração de 4 minutos e 8 segundos divulgado em seus sites e redes sociais; c) a audiência de instrução e julgamento foi dividida em dois atos, realizados respectivamente nos dias 20.7.2020 e 27.7.2020, tendo o segundo dia a duração de 3 (três) horas e 11 (onze) segundos, dos quais 45 (quarenta e cinco) minutos se destinaram à oitiva da vítima.

Pela decisão, a retificação “deverá ser divulgada na mesma proporção, tamanho e espaços destinados às matérias veiculadas, permanecendo pública até nova decisão judicial em contrário ou o julgamento definitivo da presente ação”.

Indenização

Conforme informou o Portal JusCatarina em suas redes sociais durante a semana, o juiz Rudson Marcos e o promotor Thiago Carriço de Oliveira buscam reparação por danos morais em razão de matérias publicadas pelo site The Intercept e pelo site do jornal Notícias do Dia, com sede em Florianópolis. Nas ações, os autores buscam indenização de R$ 450 mil e R$ 300 mil, respectivamente.

Nesta sexta-feira, o Sindicato dos Jornalistas de Santa Catarina e a Federação Nacional dos Jornalistas emitiram nota de apoio à repórter que assina as matérias contestadas. (LEIA AQUI)

Procedimento comum cível nº 5080469-35.2020.8.24.0023

Procedimento comum cível nº 5080008-63.2020.8.24.0023

SAIBA MAIS

Entenda porque a Justiça absolveu acusado de estupro em beach club de Jurerê Internacional